quinta-feira, outubro 28, 2010

Tudo podes

Podes soprar-me nos ouvidos os frutos das tuas insônias.
Podes aquecer-me o pescoço espalhando o teu hálito sobre ele.
Podes me entorpecer com a frequência de tuas confidências
E exasperar-me diante de tua espera.
Podes sorrir delicadamente. Só tua boca tem volumes saborosos.
Podes abrir os braços e me desenhar abraços, pois teu corpo já é dantes meu abrigo mais terno.
Jogues fora as dores que te fazem partir ao meio a certas alturas.
Pule comigo dos precipícios. Lá embaixo, nos encerramos a sóis.
Sim, há de haver um esconderijo para que eu te proteja da cegueira dos ventos.
Lá no firmamento do desconhecido só há brisas.
Então lá, podes soprar-me teus desatinos.
Podes sorrir e ser meu riso!

Perdestes, é fato.

Tuas mensagens cifradas, "arrumadinhas" assim, denunciavam o sabor amargo de tuas intenções.
Não creias nunca que teus disfarces nunca te deixarão revelar.
Não precisas demonstrar sinceridades, basta tê-las.
Isso de demonstrar fica para atores.
Não. Este complexo de cenas não tem papéis definidos. Podemos assumir nossas ruínas, mesmo com todo o medo dos olhares.
Nem sempre o tempo é anestésico. A vida é feita de perdas irreparáveis e inimagináveis para que os caminhos permançam significativos.
Poeira em excesso não somente embaça a visão, como perfura os olhos e o coração.
É preciso perder. Saber perder para entender o sentido real de tudo e de todos.
Perdestes esses versos. Alguma coisa de amor que existia neles.
Então não te maltrates, apenas siga. Não há enigmas, só não existem mais outras vias...
Esses caminhos cruzados se descruzaram para encontrarem a si próprios.
A solidão pode ser só um aviso, ou mais que isso: um efeito.


Estrada somos, estrada sou...

Somos estradas nesse eterno (des)caminho que é o mundo.
Meus pés estão calejados. Caminhar é vício, é destino.
Ser estrada é desatino!
Poucos anos vividos. Despertando os olhos amanhã, meu coração avisa de mais alguns minutos.
Correr, pausar. Velocidades da inconstância dos momentos.
Água para lavar a face. Café para arder por dentro.
Eu (re)pouso nas encostas, meu abrigo é o perigo.
Grito!
Somo um riso ao outro para subtrair chorinhos...
Contudo, acima de tudo, estrada eu sou.
(des)ando. Me encerro. Percorro (a)o léu.
Nada ao certo. Todavia, eu não só via a vida, eu a vivia!
Se estrada sou, então sou percurso.
Se estrada sou, então sou deslocamento, movimento.
Sim, isso é coisa do tempo. Eu deslizo, eu caminho, de mim mesma eu participo!

Senti(r)

Eu tenho aqueles modos que te afetam os sentidos.
Eu tenho o cheiro da saudade!
Eu tenho olhos de intensidade,
O barulho da insanidade,
E os sabores da paixão!
Sim, eu toco o céu anil
Eu te faço pousar em nuvens.
Por razões já não passíveis de explicações,
Contigo eu mergulho num oceano de desejos.
Sentir nunca foi tão (in)voluntário.
Sem ti nunca fui tão pedaço!


Dia solar e dor

Está tudo solar nesses últimos dias.
O astro rei brilha imenso.
Os seus raios nos colorem,
Os calores nos aquecem...
Tanta coisa aconteceu e o tempo vai tragando tudo.
A alma não tem tempo. A alma segundo dizem é imortal.
Os dias são como janelas: se abrem para nós, para que nos abramos para eles.
O mundo para mim, é essa história cotidiana que narro em versos evasivos.
Eu tenho asas que me fazem voar pelas planícies da imaginação e tenho olhos para observar as flores.
Eu tenho retratos coloridos de uma época multicolorida.
Eu sinto aqui em mim, a temperatura da vida, entre o vaçilo e o pódium.
Aquelas manhãs em que eu dormia sem sono para esquecer do mundo já não são tão anestésicas.
Então eu encaro a dor como uma agulha que me fura, me devolve o medo, mas não faz esquecer de superá-lo.
Esse cerco solar me invade para provar que permaneço pulsativa/pensativa.

























terça-feira, outubro 19, 2010

Para não dizer que não falei das dores...

Hoje eu ouço a hipocrisia escorrer nos discursos
E a vida e solidariedade serem progressivamente questionadas.
Hoje eu vejo a fome correr pelas calçadas, viadultos e praças.
É indescritível isso de perceber a dor da fome estourando no frágil estômago de crianças...
É duro ver a miséria ser o chão onde elas pisam
E um futuro diferente disso só sobrevoá-las, sem de fato, alcançá-las.
Dói o descaso desse indidualismo estanque que nos permite esquecer a desgraça que acomete nosso semelhante.
Fere, a forma como nossos irmãos humanos escravizam e desdenham uns dos outros.
Tudo isso compõe essa minha cena de lamento...
Essa mágoa que guardo de mim mesma e do mundo.
Indigno é todo aquele que ignora esta caótica realidade...
Insano e egoísta é quem vive fingindo que nada nisto existe ou nos afeta.
Todavia, uma hora a dor do mundo lhe afetará.
De um modo ou de outro, tu te dissolverás na mesma terra batida e te misturarás a mesma poeira que a envolve.
Tu e aquela criança que de fome foi assassinada, se transformarão no mesmo pó.
Espero que de fato as almas permaneçam e que haja lugares para abrigá-las.
Espero ainda que o Deus e os deuses tenham piedade e misericórdia da tua omissão.
Misericórdia que não tivestes pelos teus semelhantes.

domingo, outubro 17, 2010

Naquele dia

Sim, era Oswaldo Montenegro que eu ouvia enquanto chorava...
Naquele dia eu estava ainda mais frágil.
Naquele momento eu era toda dor.
Tudo era melodiosamente melancólico.
As lágrimas desencatavam...
Sim, era "Bandolins" que tocava ao fundo...
Nostalgia! Só nostalgia.
Medo.
Naquele dia eu só desaguei as decepções, os chutes, os tapas.
Era banho que eu tomava...
Era da incompreensão que eu me despedia.
Eram as sujeiras que me indignavam.
E como a música dizia:
Eu valsava só pela madruga...
Me julgava amada.

Mundo e pureza

Seu olhar é puro, mas o mundo é como um calabouço.
O mundo não tem pena de nós
E os homens não são tão complacentes.
Sua pureza é armadura de sensibilidades.
Marca de grandeza.
Entretanto, o mundo quer de nós um tanto daquilo que não podemos dar.
O mundo e os homens querem nos forçar à uma equação ontológica.
Ela é falida eu sei, mas essa falência não é tão admitida assim...
Não quero dizer que o mundo seja ruim
E nem te fazer crer que há tanta bipolaridade em tudo.
Sei apenas que há um calvário.
Entra nele que está disposto a ver o sol em grades,
A reinventar a ideia do sol constantemente.
Tudo temos que reconstruir quando tentam abalar nossas visões.
Sentir é para nobres.
Viver é para poucos.
O resto é farsa.
Não gasto tempo destruindo tudo, mas desarrumar a casa é preciso.
Têm momentos que ser perigo é a condição para ser feliz!

Membranas, memórias e lembranças

No dia dos absurdos
Eu não estava em apuros.
Ali eu nem sei o que fazia,
Nem sei se sorria...
Só sentia ausências.
Era tu que me faltavas.
Só tu, teu corpo, tua fala.
Eu olhava ao redor e me envenenava.
Me entorpecia, pois minha mente fugia.
Tudo era labirinto e tu não saías de minha mente.
E tu continuavas sendo a minha membrana.
Eu só imaginava a nossa cama.
A nossa forma insana de sentir a chama.
De provocar a chama.
A nossa maneira de nos aquecer-mos.
Meu corpo: teu lençol.
Teu olhar: um convite irrecusável.
Tu não foges dos meus pensamentos.
Tu és como a minha memória intransponível.
Adias tua estadia em mim.
Caminhas comigo pelos jardins.
Mordes àquela maçã e mastigas as hipocrisias.
É hora de cuspir e tu cospes o que nos enoja.
Tu cospes os vãos olhares, as prepotências.
Tu me incitas os desejos e me tornas arredia.

Estrelas, poetas e poemas

Vou roubar uma estrela lá do céu quando for noite...
Sei que roubar estrelas é uma tarefa dos poetas,
Só eles sabem como arrancá-las de lá
Para presentear suas amantes,
Para conquistar suas pretendentes,
Para encantar seus leitores.
Os poetas podem tudo
E as estrelas são recursos que a noite oferece a todos.
Nós românticos em excesso.
Imaginativos ao extremo.
Nós, esses loucos desconsiderados.
Apaixonados por tudo e por todos.
Descolados dos rigores.
E assim, oferecemos aos poemas seus sabores
E ao poetas nossos encantos.
Os poetas nos fascinam.
Dizem o que queremos dizer.
Falam tão surpreendentemente do que sentimos lá no íntimo.
Poetas são nossos companheiros
E suas poesias são nossos disfarces.
Eu queria tanto roubar uma estrela!
E guardá-la no porta-jóias
E embrulhá-lo para te dar.
Sei que não sou poeta...
Mas sei que posso me imaginar.

Sobre sol, ardências e raios

Há um sol enorme.
O observo da janela,
Mas a verdade é que é aqui dentro que tudo queima...
Meus olhos são como pingos dourados.
Meu corpo é todo quentura.
Todos os dias nessa temperatura.
Meu coração pulsa e ferve.
É todo suor.
Todo suor escorre da minha pele me avisando que estou viva!
Ah, tudo em estado gasoso,
Borbulhando em mim.
Alegrias em chamas!
É a vida ardendo em mim,
Avisando da rima,
Da lírica canção.
Evaporo... Sim, eu evaporo as dores
E invado a sala com o brilho dos meus olhos,
Com a sede da qual sou constituída.
Jatos de luz.
Sou fogo em noites e dias
E avessos em madrugadas.
Eu fisgo, eu frito, entorto o aço.
Eu me desfaço. Eu arremato os fatos
E não infarto.
Amarelo, alaranjado, o sol reina lindo lá do outro lado...
Lá fora é entronado.

Eclipses e incômodos

Vejo um pouco de incômodo nas expressões da tua face.
Parece que você tem medo do que realmente pensa a meu respeito.
Você teme que a noite já não seja tão obscura quanto se apresenta até aqui.
Eu queria poder reter esse incômodo.
Esse desagravo.
Sei que te apavoro por muitas coisas,
Mas sei que te conquisto com a minha doce alegria,
Com a minha naturalidade.
Sei que o mundo é assim mesmo, que os espelhos são foscos
E as nossas fotos se embaçam.
O mundo te diz de mil maneiras que sou teu erro.
A rua te insinua o meu destoar.
Sou como eclipses: mesclo os tudos.
Equilibro os tons.
Nesses instantes que nos dividem entre luz e escuridão,
Eu te surjo como eclipse
Para te provar que o turvo e inesperado, o mágico e inesperado
Podem ser deliciosos!

segunda-feira, outubro 11, 2010

Bossa nova

Algo me arrasa.
Algo me passa na cara a possibilidade da ilusão.
Então eu ouço bossa nova em francês e esqueço tudo.
Ouço só alguém sussurrando palavras em idioma estranho.
Essas melodias me envolvem.
Me transportam para lugares de sei lá o que...
Eu viajo... Sim, eu viajo!
Eu vou até teu corpo e bailo com ele nessa batida.
E deito em teu colo para que me acarinhes.
Para que me intrigues com tuas perguntas.
Para que me retires as dúvidas.
E que dúvida eu poderia pensar em ter se estarei contigo?
Que fatal nota musical me faltaria completar na partitura?
Ah, tu estarias ali comigo... Bailando romanticamente ao som de uma bossa nova.
Qualquer lugar seria um rio repleto de janeiros e fevereiros e marços...
Qualquer lugar ajuntaria um ano todo.
Qualquer lugar seria meu: pois, lá, tu estarias!

Cor e palidez

Pensamento lento.
Pestanejando ao relento.
Ah! Idéias sem donos...
Caminho sem pousos...
Saudades de tudo!
Dias claros para fazer surgir cores vastas.
Hoje, quero pintar as paredes da casa
Enfeitá-las.
Vou escrever meus poemas esparsos
nas portas, nos armários.
Vou preparar um café meio-amargo
Para cumprir meu doce vício.
Vou fingir que renego o tempo
Sou descontinuista de momento.
Hoje tem cor e palidez em tudo.
Lá fora grita a dor do mundo.
Aqui rasgo em mim as turvas desatenções das quais sou feita.
Eu sou fragmento
Desse vão isolamento
Dessa lamúria vislumbrada.
Trai àquelas almas da calçada.
Trai os grifos.
Estou marcado, meio algoz, meio atroz.
Sou réu confesso dos crimes dos sensacionistas.
Não se enganem: é sensacionismo o alarido das sensações.
Nada de sensacionalismo...
Tudo aqui é só o que sinto.
Vou embora abrir o portão...

Desculpe-me

Desculpe-me, mas só sei falar de amor.
Não conseguiria falar de algo diferente disso.
Não terminaria verso algum se assim fosse.
Eu só sei falar desse sentimento que me arranca os pés do chão
E me faz flutuar
Me encerrando em devaneios.
Eu só sei amar a lua, o sol, as nuvens e os pássaros.
Eu só sei sentir os dias e as noites sem a necessidade total do tempo.
Eu só sei morrer de amores!
A cada dia que morro é de amor que pulso.
É por amor que louvo.
E se amanhã desperto vivo, é pra senti-lo todo,
De todas as formas possíveis.
Com todos os tons e timbres.
Desculpe-me mais uma vez...
Sei que parece mesmo bobo,
Mas é o que o amor nos torna loucos.
Nos permite vôos nunca antes dados.
Ele, o amor, vai além do coração e faz morada na alma.
Ele, o amor, puro e dono de suas vontades é que faz a escolha
E nela nos apossa, para que sem saída, amemos.
Amemos ao outro como a nossa canção preferida.
Amemos ao outro para termos uma medida exata do nosso amor por nós mesmos.

Roma

Pelas ruas de Roma eu respiro as histórias
E lembro da tua pele escondida em sobre-tudos negros...
Os vinhos que saboreamos
E a forma como nos olhávamos...
Tudo me retorna...
Lembro do meu italiano mal falado aos teus ouvidos...
Eu queria te apaixonar...
Te amolecer com a textura das minhas palavras
E a quentura da minha respiração...
E de mãos dadas contornávamos as calçadas...
As estátuas nos contemplavam,
Aguardavam a cena do nosso beijo.
O frio nos convidada a manter-mo-nos próximos!
Ah! Eu te recordo todas as horas!
Ah! Eu te venero!
Ah! Eu não te esqueço...
Ah! Teu sorriso me guia e tua voz me acalma.
Tua letra se encaixa nas minhas melodias.
Nosso acorde distrai os acordos.

E o ridículo...

Não sei de que tanto de amor sou feita!
Somente reina em mim essa forma intensa de ver o mundo!
Sou essencialmente romântica.
Estupidamente melancólica.
Desmedidamente insana!
Eu me jogo no agora
E nem me mordo para saber do depois...
Sou presa a esse instante e a todas as expectativas que crio nele.
Sim, eu crio expectativas!
Eu não tenho medo de quebrar a cara
E nem de parecer ridícula.
Eu não tenho medo de ceder no primeiro olhar
Eu não insinuo, eu me entrego.
E se isso for absurdo, infantil ou louco,
Então eu sou tudo isso e mais um pouco.
Então me assumo assim:
Passional, carente...
Amante... Ingênua.
Sim, sou todas as coisas nostálgicas
E desenho também os sorrisos mais sinceros e naturais.
Sim, eu não me controlo!
Sim, eu sou assim, não tenho véus.

O que te espera

Meus olhos te desejam serenos
Meu dia, meu céu nesse canto pequeno!
Minhas flores, meus vasos, meus enfeites
Tudo se espalha pela casa.
Meu quarto te espera.
As cortinas da janela são alvas
E balançam suavemente com o vento.
A nossa essência preferida já perfuma o ambiente.
A música, o ritmo, as melodias, tudo já está pronto.
Tudo à tua espera.
Tudo para te acolher.
Tudo para deixar-te à vontade.
Todo excesso de romantismo para derreter-te.
Todo beijo mais pedinte para enlouquecer-te.
Todo o meu corpo para aquecer-te.
E os meus braços para envolver-te...
Além horas. Além tudo.
Ancoras na minha cabana.
Vens viver comigo essa loucura!

domingo, outubro 10, 2010

Sobra

Já não tenho mais palavras para falar do que me falta.
Hoje eu sei apenas do que me sobra.
Sei que me sobra sentimento e esperança.
Tudo isso se transborda em mim, me inunda e me compõe.
Sentimento e esperança me dispõe.
Ah! Eu queria apenas soar-te umas palavrinhas ao ouvido!
Me sobram coisas para dizer-te.
Contudo resumo numa só medida: essa minha cadência do amor!

Os laços

Não permitirei que o mundo sugue minhas forças!
Não engolirei as conclusões arredias e nefastas acerca do que vivo.
Me darei o direito de ignorar os ataques histéricos daqueles que não sabem amar,
Que não sabem sentir o amor ao contemplar uma flor...
Minha vida, meu sentimento, minha história é da cor que pinto.
Eu sei que cada instante de amor é precioso.
Cada palavra de amor é alimento.
É pouso. É mais que consolo, é ouro!
É raro, seja nítido ou não.
Mas o amor nunca será uma tela de espelhos.
O amor é perceptível para poucos.
É um dom, uma apreciação construída pelos olhos do coração.
Eu te olho por dentro de mim.
Eu me enxergo olhando para ti.
E assim eu me desfaço, eu me refaço. Eu faço pactos.
Eu sou pedaço. O teu pedaço.
E o mundo e os vãos? Ah, eles são rastros, percalços...
Nenhum caminho é puramente fácil.
O mundo e os vãos são recados para avisar-nos que temos laços!
Os criamos!
Não vamos desatá-los!

Equilíbrio e amor

És um ponto de equlíbrio.
O meu ponto de equilíbrio!
Vens de uma ponta à outra do universo para afirmar-se aqui dentro de mim!
Pontilhas o mundo com o teu gesto nobre
E distribuis pelas horas a firmeza da entrega!
Eu sei que estais no balanço dessa brisa que me percorre
E no vapor dos meus lânguidos instantes presos às lembranças.
Eu sei que podemos matar as dores a cada dia
Vencendo-as.
Aliviando-as por abraços.
Tudo em nós é grandioso!
Tudo em nós é amor!

terça-feira, outubro 05, 2010

O que é poético?

O que é exatamente poético aqui?
Esse escuro incendiado por um leve reflexo de luz?
Essa madrugada de nem frio ou calor?
Essas mãos que não se encontram?
Esses pensamentos que incontrolavelmente me fogem agora?
Ah! Poético é ouvir tua voz pedinte!
Poético é senti-la como mel a derramar.
É transmitir-se dela para ela.
Poético é responder-te com sussurros
E te entorpecer com excesso de palavras e sensações.
E te merecer pelo resto das horas que ainda me faltam.
Pelos sonhos que cruzamos.
Pelas luas que enxergamos buscando um ao outro como ao firmamento.
Que aquelas estrelas lá fora me reparem a dor de não te ter aqui...
Que tu estejas pensando em mim.
Esta é a minha condição para sorrir.
Para seguir.
Para voar para perto de ti.

Borboletas

Por pura necessidade meus olhos desejam mirar-te nesse momento!
Por total insanidade desejo tantas outras coisas além disso!
Estou diante de mim.
Falta-me você, meu céu!
Falta teu brilho.
Tua cor, teu jeito anil.
Falta-me inexoravelmente teus olhos negros
E tua face límpida.
Falta-me tua voz em acalantos.
És a membrana que protege-me do vírus do mundo!
E és ao mesmo tempo a minha fronteira de encontro com as belezas dele!
Sou todo o teu pedaço.
A continuidade do teu rastro.
A tua alegria desmedida.
Sou tudo que quiseres que eu seja.
Somos belas borboletas!
Metamorfoseadas.
Voando rápido.
Fugindo pra sei lá.
Deitando por sobre as flores sem sugar-lhes o néctar.
Tornando-as colo, ninho.
Palco de amor.
Livro.

Doce flor

Ah! Sinto o peso dos dias,
Ó doce flor!
Sinto o tempo reinando
E o espaço rompendo!
Ó doce flor, te temperas um instante de mim!
Não me fujas do olhar, murchando antes do meu fim!
Não reines assim sem minha admiração!
Reines comigo, ó doce flor, no caminho dos sonhos...
Venhas e fazes morada comigo em sonhos infinitos,
repletos da grandeza inatingível que não habita o lugar chamado realidade!
Te inundas da minha loucura inadaptada.
Te consomes da minha cor variada. Nada gris. Nada pálida.
Aqui, no mundo dos sonhos, sou da cor que quero
e posso até ser arco-íris.
Aqui nesse mundo rarefeito, não preciso ser perfeito,
pois é do imperfeito que me enfeito!
Ó doce flor, de mim não fujas!
Não me resguarde de teus sabores!
Não te furtes da minha loucura.
Garanto-lhes: ela não é tão ofensiva quanto parece.
Ela é só vontade.
Gana por algo que ainda não sabe,
mas que um dia sonha sabê-lo
ainda que incompleto,
pois nada completo de fato completa um anseio.
Não satisfaz, não afaga.
Só distorce o conceito e destrói o vercejo!

Águias e bobagens

As próximas bobagens escritas serão feitas do vazio
E para o vazio voaram como águias!
Essas bobagens das quais me faço,
Essas bobagens nas quais me envolvo,
Nessas bobagens todas, ferozmente me dissolvo!
Nessas bobas passagens, a escrita me dilacera.
Me (in)completa.
Esperneia dialeticamente.
É loucura. Devaneio.
Tudo destoando por inteiro.
Isso é tanta coisa que nada renova.
Só repete. Só mastiga.
Só devolve.
Só decorre de mim e corre para algum lugar.
Talvez para o vazio.
Talvez como águias para a liberdade dos vazios.
Para os buracos infinitos do nada-ser.
Do nada-poder ser.
Já que tudo é assim,
não fujo ileso.
Nas asas das águias transponho meus medos
para que eles voem
e mais do que isso
para que desaguem.

Lamúrias

Minha prece, minha mágica.
Minha intuição, minha força.
Intento. Já não tento.
Já faz tempo que nada tenho.
Aliás, o tempo age lá fora, ao relento.
Alento?
Onde mora isso que não vejo?
Onde está a força da prece e a mágica da intuição?
Onde está a canção que me faça suportar a falácia, o degredo?
Tanto segredo, tanto medo aí fora e aqui dentro!
Contudo, com nada pouco se faz...
Munido de tudo, posso ir ao fundo desse não-lugar que sou...
Dessa voz que cessou breve.
Que nada sabe cantarolar.
Que a nada já há tempos não enfeita.
Que por quase tudo de tudo foge e se prende.
Por quantas razões lamento esses embargos?
As pressões nessa fala...
As portas fechadas dos quartos e salas...
As almas embaçadas.
As fontes que secaram indignadas!
Por nada mais lamento.
Por tudo mais degredo.
Purgo.
Vejo.
Tenho ou não tenho.
Despejo.

Rotineiro desejo

Rotineiro desejo é esse que me percorre.
Não tenho como controlá-lo.
Ele é impulsivo.
Intempestivo.
Ele é tudo que me atravessa e me torna fugidio.
E ao mesmo tempo é tudo que me prende e, me toma o destino.
É céu enfeitado de um luar imenso.
É sol para raiar em mim.

domingo, outubro 03, 2010

Sangrei

Sangro! Esta é a minha forma de sorrir!
Esta é a minha maneira de orvalhar!
Correndo pelas veias. Pulsando insatisfeita...
Há um rio de sangue dentro de mim
E aguadas vontades de nós!
Sangrando assim, parece que tudo se dilui.
É dor, é riso. É sorte, é desalinho.
Sangra breve, contudo sangra forte!
É líquido tinto...
É vinho perdido. Derramado.
Lambuzado. 
Com gosto de tudo.
Sem explicar nada.
Apenas gotejar.
Ser chuva das uvas.
Das rubras cores.
Dos calores, das manchas.
Cálices para não mais calar-me.
Doses, para enfim sangrar-me!
Embriagar-me simplesmente por banhar-me.
Sangrei. Voltei. 

sexta-feira, outubro 01, 2010

Outubro e metade


Já é outubro,
Sonho incontrolavelmente...
Já é outubro
E está tudo ainda mudo...
Vens para ver o sol
Laranja e vermelho de raios nada gris!
Atracas nesse porto
Insano, esperançoso...
Já é outubro e mesmo assim me olho no espelho
Reflexos teus invadem
Avisam-me da metade que há tempos me tomastes!
Tornaste-me metade.
A minha outra parte és tu!
Completas minha face.
És em outubro e em todo mês que houver
A minha outra metade!

Gritos


Teus gritos! Quero os teus gritos!
Quero teus sons, seus gemidos...
Seus delírios ao pé do ouvido...
Quero teu riso não tão breve e nem indeciso.
Quero dividir contigo essa metade incerta do meu caminho.
Quero a passagem das horas contempladas diante da natureza dos teus olhares.
E soprar-te as letras das canções que juntos cantamos
Para que assim não mais te esqueças de nossas cumplicidades
De nossas formas de sentirmo-nos em presença constante ainda que distante.
Quero encantar-te com aquela minha forma de sorrir da qual tanto te agradas!
E preparar-te aquele café forte em meio às possíveis noites congelantes
Para aquecer-te o hálito e os lábios
A interioridade de teus sabores...
Quero provar-te daquelas maneiras que te desmancham...
E conservar-me na temperatura do teu corpo
Diluindo as dores, abrigando-me dos desprazeres da inadequação.
Ah! Quantas coisas desejo viver sentindo agora!
Quantas palavras me são completamente inúteis nesse momento para definir-me diante de ti...
Contudo, posso tentar resumir:
Olhas, tu que estais aí no outro lado da porta,
Deixe-me uma vez ao menos viver a sensação de reconhecer-me em ti!
E entrego-me, em silêncio, para gritar dentro de ti.

Bailando

Bailar na tua cintura...
Senti-la em mim reinando...
Rompendo os silêncios
Com seus sons errantes...
Tudo nos passos por todo o salão
Vigiados pela lua que dá brilho à noite escura.
Sem licenças, sem premissas,
Sem dilemas...
Nosso bailado dourado
Inebriado do pecado se espalha livre!
Nas mãos enlaçadas
Nos rostos colados
No ritmo compassado
Balanço para a vida valer sempre à pena contigo!
Encantos de movimentos que não cessam com o vento!
Conduzo-te suavemente
Você “baila comigo”...
Olha-me nos olhos
Difere tudo ao redor
Insinua um querer caprichoso, surpreendente, voluptuoso.
E bailamos pela noite a fora
Colados, sedados, nossos corpos esquecem o outrora
Afrontam o agora
Suam até novamente sentirem-se secos!
Mas sempre juntos!
Envaidecidos de sua malemolência.
Crentes de que em nada tem que crer
Para sentirem qualquer tipo de certeza pairar sobre si.
E assim, eles flutuam.
Nada fingem.
Não se inibem.
Só desse seu calor sobrevivem!