quinta-feira, agosto 26, 2010

Fado Anacrônico


Estou a ouvir aqueles fados! Aquelas melodiosas canções que para alguns são puro lamento... As vozes regidas daqueles sotaques lusos entoam um canto. A saudade é o tema de predileção. Fechando os olhos, viajamos na inércia das horas e tornamos aquele instante único em nós, dentro de nós. No fado a saudade é como que gritada, dilacerada... A alma parece querer romper em si a urgência do que não se calcula... As violas, os bandolins, tudo se afina na fina chuva de sensações. Os cenários se transpõem na mente. E continuamos melancólicos, poéticos, sensíveis à flor da pele. E as insalubres gotas d’água se escorrem dos olhos sob o descontrole que se apodera em nós. A rua deserta. Já é noite e só os caídos pelas calçadas, exaustos do excesso etílico, nos ouvem ainda que insanos. Nossos sons são rios que correm para o mar. São encontros, fluências... A lua está a enfeitar o céu, no recanto da fotografia. O papel está em cima da mesa de um dos cafés. Temos sede de cafeína, de vinho e de verso. Temos fome de dor, de riso, de difusão. Somos obsessivos pelos agudos da canção, pelos retornos graves das toadas... Vagamos em busca de nós como se assim somássemos algo do que somos em matéria e espírito. Como se assim recuperássemos as horas ornamentais do passado. Como se rompêssemos a própria possibilidade de romper o véu de maia. Porque o que seria dessa nobre vida real se a ela não se juntasse todo o risco da ilusão?

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